domingo, julho 04, 2010

A menina e o pato - Parte II

Quando chegava da escola, ia correndo chamá-lo com um assobio que só ele atendia. E, durante o resto do dia, era ao lado dele que ficava. Almoçava com ele ao pé, depois fazia as lições de casa no quarto ou no quintal, sempre em sua companhia. Nos dias de calor, gostava de ficar na sombra das árvores do lago, onde lia seus livros de histórias. Às vezes, lia em voz alta e o pato parecia entender. Quando nadava no lago, ele também acompanhava. Precisavam da companhia um do outro, apesar de terem seus amigos e familiares. Sim, porque o pato também tinha o seu grupo: pais, irmãos e amigos. Era com eles que ficava boa parte do tempo, mas, quando possível, largava tudo para estar na companhia da menina.
A menina, por sua vez, não deixava de lado os amigos da vizinhança. Brincava, passeava, catava frutas no pomar do vizinho, ia à igreja para as aulas da catequese, mas, quando podia, fazia-se acompanhar de seu novo amigo. Já tentara levá-lo à igreja, para a missa de domingo. Ele demonstrara, naquela ocasião, bom comportamento, mas o padre e os demais fiéis não suportaram dividir o sagrado momento da missa com um pato. Rejeitaram o bicho e o padre pediu gentilmente à menina que não o levasse mais à igreja. Ela nem retrucou. Sabia que as pessoas achavam esquisita aquela amizade com o pato. Fosse ele cachorro ou gato, talvez não reclamassem tanto, mas um pato? Era a pergunta que faziam. Como alguém pode querer andar com um pato?
Ela queria! Gostava da atenção que o pato lhe dava. Não lhe importava que os outros achassem-na diferente. As críticas não a incomodavam, desde que estivesse ao lado do pato. E foi exatamente assim que a menina cresceu, entre a companhia do pato e dos amigos que, com o tempo, acostumaram-se com aquilo que chamavam de esquisitice. Inúmeras vezes, o pato sentava-se nas rodas de amigos, como bom ouvinte das conversas de adolescentes. Nem o primeiro namorado, nem o noivado vindouro afastaram a menina da ave.
Sofreram um pouco, inicialmente, a menina-mulher e o pato, ao afastarem-se para dar lugar ao recém-chegado companheiro. Mas este também afeiçoou-se. Não se sabe se o próprio animal conquistou o rapaz ou se foi aceito por amor à moça; o fato é que os três eram vistos juntos na beira do lago e até na praça da cidade.
* Fim. Pensei em continuar contando que eles foram felizes para sempre, criaram os filhos com o pato até que ele morreu de morte natural (o pato vive até 28 anos e amado desse jeito deve viver mais). Depois pensei em matar o pato, assá-lo e servi-lo em família sem que ninguém soubesse que era o tal pato, obra de uma cozinheira psicopata empregada pela moça. Na dúvida, coloquei o ponto final.

3 comentários:

Xaxá Bukowski disse...

Uma opção seria a mulher chegar em casa e encontrar o pato na cama com o marido, aí ela gritaria indignada: "Quer dizer que o pato aqui era eu?!?" E iria embora pra sempre com o cachorro do vizinho.

Silvio Freire disse...

Sinceramente, acho que você deveria fazer umas 3 ou 4 versões do final e colocá-las em uma enquete, aqui no seu blog, e então definir o final que a maioria escolher.

Patrícia Gonçalves disse...

Só de saber que você pensou em matar o pato já amei!!! Meu humor negro não perdoa uma!!!

Cara, nunca ouvi falar que os patos vivem tanto, mais que cachorro!

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