domingo, dezembro 27, 2009

O que se pode esperar do outro?



Meu mp3 sumiu. Aliás, um fato totalmente compreensível para quem anda guardando celular em geladeira e procurando, pela casa, chaves que estão no bolso. Daí que as pedaladas na praia ganharam um sabor especial, já que, em vez de músicas e palestras, fico escutando minha própria voz, num engraçado colóquio comigo mesma. Às vezes, sucedem-se perguntas e respostas num diálogo interno divertido.
Um dia desses, depois de algum tempo nesse movimento, resolvi calar todas as vozes e observá-las, como se fosse um espectador externo. Percebi tantas pessoas dentro de mim que eu fui fazendo uma lista de chamada. A menina chorosa e mimada apresentou-se logo, porque adora chamar atenção e faz birra quando contrariada. Mas, em seguida, descobri uma mulher linda e muito vaidosa, outra zen, uma fútil, outra erudita, a popular, a requintada, uma outra forte e poderosa de voz firme e nada manhosa e por aí fomos. Apresentamo-nos umas às outras.
Tudo isso foi para responder a uma pergunta que fizera a mim mesma sobre o que se busca em outra pessoa, que se constitui no ingrediente mantenedor de um relacionamento de qualquer sorte. O que é capaz de garantir o sucesso e o fracasso de uma relação? Por que certas relações deterioram-se com o tempo? E por que muitos esperam que o outro preencha todas as lacunas de que não se acham capazes de preencher por si só?
Bom, depois de me apresentar a tantas pessoas que habitam dentro de mim, pensei que não precisaria buscar coisa alguma em alguém, fossem eles amigos, marido, filhos, pais... Em termos de diversidade, eu sou suficiente para promover uma festa. Lembrei até de Clarice Lispector, que usava o termo de que mais gosto para definir seus/meus múltiplos “eus”: “Sou caleidoscópica.” Mas isso não significa ser autossuficiente.
Pensei que talvez busquemos no outro, o que não temos coragem de buscar em nós mesmos e que talvez seja essa a origem de tantas decepções e assunto de um próximo post. Mas, se reconheço o outro como um ser também múltiplo e completo, talvez o resultado de um bem aventurado encontro seja uma verdadeira festa de “eus”, onde cada um traz a si mesmo de forma integral, buscando apenas o compartilhar do dia a dia e a complementaridade de sua própria existência.
Talvez, só talvez, porque respostas nessa área são sempre imprecisas, possamos reduzir o número de desencontros e as decepções de toda a ordem. Afinal, se me reconheço como pessoa plena e múltipla, libero o outro do encargo de me completar e busco somente o compartilhar das minhas experiências, com menos ansiedade e cobranças. Tudo vira uma grande festa. Talvez...

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